segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Críticas: Heróis com os louros dos outros

Notícia do Correio da Manhã de 2 de Agosto de 2010: "Instituto de Socorros a Náufragos salva 274 vidas"
Confesso que, ao ler esta gorda, fiquei com a remota esperança de que tivesse sido descoberto, finalmente, um meio milagroso de salvar vidas no mar. Como é que o Instituto de Socorros a Náufragos (ISN), que dispõe de tão escassos recursos, como é assumido pelos seus responsáveis e do conhecimento público (quem passa pelos portos marítimos e vê atracadas as poucas e obsoletas lanchas de salvamento, sabe do que estou a falar!), já salvou, desde o início da época balnear (em 1 de Junho), 274 vidas!!!??
Porém ao ler o desenvolvimento da manchete, fiquei a saber que, afinal, quem salvou as 274 vidas foram os nadadores-salvadores, distribuídos pelas cerca de 400 praias vigiadas do País, arriscando a própria pele. Para os menos atentos, pode parecer a mesma coisa; para quem foi nadador-salvador durante alguns Verões e cresceu na Praia Grande não é, e passo a explicar:
O Estado é responsável por garantir a segurança dos cidadãos nos espaços públicos e de acesso público, vg. via pública, estradas, recintos desportivos, etc.. Contudo, no que às praias diz respeito, e refiro-me em concreto apenas aos areais e ao mar, a responsabilidade do Estado, excluindo as praias vigiadas não concessionadas cuja responsabilidade pela vigilância cabe às câmaras municipais, resume-se à presença de (poucos) elementos da Polícia Marítima, que não intervêm em salvamentos no mar, e à participação do ISN na segurança nas praias. E qual é a intervenção do ISN neste sistema de segurança (chamemos-lhe assim)?
Este Instituto vende cursos de nadador-salvador, que custam 127 euros por pessoa (este ano, o seu valor aumentou de 75 para 127 euros) por quinze dias de aprendizagem de técnicas básicas de reboque no mar e de reanimação e vende aos concessionários, por valores avultados, todo o equipamento de salvamento, desde bóias, pranchas, barbatanas, cordas, passando pelos equipamentos dos nadadores-salvadores e pelas bandeiras de sinalização do estado do mar, tudo isto de aquisição obrigatória por parte daqueles. Ó senhor jornalista do CM, é isto que o ISN sabe fazer: recolher boas receitas para o Estado. Os salvamentos são feitos por nadadores-salvadores, sob orientação e remunerados por privados, os concessionários ou, numa minoria dos casos, por câmaras municipais (modelo utilizado no litoral alentejano).
A Segurança dos cidadãos, tal como a Defesa, a Magistratura e a Diplomacia, são consideradas as funções nucleares do Estado, por serem aquelas que garantem a sua soberania não sendo, por este motivo, alienáveis. Por este motivo, o Estado não devia, através de contratos de concessão, deixar esta missão entregue a privados, demitindo-se de uma responsabilidade que é pública.
Assim como não devia recolher louros do esforço e do risco alheios...

1 comentário:

  1. Sabendo do que falas por presenciar, acho que este link deveria ser enviado aos senhores do CM.

    ResponderEliminar